quinta-feira, 15 de abril de 2010

(...) "Devo estar louco." (...)

"Se eu quisesse, enlouquecia. Sei uma quantidade de histórias terríveis. Vi muita coisa, contaram-me casos extraordinários, eu próprio... Enfim, às vezes já não consigo arrumar tudo isso. Porque, sabe?, acorda-se às quatro da manhã num quarto vazio, acende-se um cigarro... Está a ver?

A pequena luz do fósforo levanta de repente a massa das sombras, a camisa caída sobre a cadeira ganha um volume incompreensível, a nossa vida... compreende?... a nossa vida apresenta-se ali como algo... como um acontecimento excessivo. [...]


Uma vez fui a um médico.
- Doutor, estou louco - disse. - Devo estar louco. - Tem loucos na família? - perguntou o médico. - Alcoólicos, sifilíticos? - Sim, senhor. O pior. Loucos, alcoólicos, sifilíticos, místicos, prostitutas, homossexuais.

Estarei louco?
O médico tinha sentido de humor, e receitou-me barbitúricos. - Não preciso de remédios - disse eu. - Sei histórias tenebrosas acerca da vida. De que me servem barbitúricos?"

(De Herberto Helder, Estilo
)

Foto: (c) Helder Mendes

Sem comentários: