segunda-feira, 6 de setembro de 2010

"Menos agricultura pode significar mais incêndios e pior alimentação"

"Portugal perdeu, entre 1968 e 2007, um milhão e meio de hectares de superfície arável. A situação está a preocupar ambientalistas e especialistas, que receiam o aumento dos fogos e a perda de biodiversidade no País.

Lembro-me que há uns anos se ia até ao monte para limpar as matas. As pessoas cultivavam e estavam mais atentas aos campos. Protegendo os seus terrenos, as pessoas eram uma espécie de vigilantes da natureza." Muitos portugueses conseguem rever-se nas palavras de Susana Fonseca, presidente da Quercus, sobre o abandono dos campos agrícolas por todo o País. A perda de superfície agrícola em Portugal - um milhão e meio de hectares, de 1968 a 2007 - potenciou vários problemas: a dificuldade em detectar incêndios, a diminuição da produção de produtos nacionais e biológicos, a erosão dos solos e a diminuição de biodiversidade.

"Todos estes problemas são próprios de países de alta densidade populacional em que a acção humana deixa cada vez menos espaço ao ambiente". Carola Meierrose nasceu na Alemanha, mas já há 32 anos que lecciona na Universidade de Évora. A bióloga dedicou-se a estudar a relação entre a agricultura e a promoção da biodiversidade e começa por ditar o principal problema da perda de superfície agrícola: "a verdadeira importância da terra arável está na produção de alimentos saudáveis".

A especialista acredita que a agricultura biológica aumenta a biodiversidade, e Susana Fonseca é da mesma opinião.
"Industrializou-se a agricultura e isso veio prejudicar o ambiente, com os adubos e pesticidas lançados ao chão", lamenta a ambientalista, que acha que se deve voltar ao antigamente: "É difícil passar esta mensagem em tempo de crise, mas as pessoas têm de se mentalizar que a agricultura actual é demasiado barata. E os produtos usados vão prejudicar solos, água, provocar doenças... é um ciclo", diz.

Outro dos maiores impactos da perda de solos agrícolas é o aumento dos incêndios. A opinião de ambas as especialistas pode ser simplificada em "menos agricultura, menos vigilância, menos limpeza, mais probabilidades de fogo".

"A relação entre a perda de superfície agrícola e o aumento dos incêndios é directa. As pessoas antigamente estavam no campo e cuidavam e vigiavam a floresta", diz Susana Fonseca. A ambientalista lembra que o êxodo para as cidades e a emigração deixaram ao abandono muitos campos próximos de florestas. Perderam-se muitos pares de olhos para vigiar a zona, braços para limpar as matas, cujo mato era usado como alimento para animais ou adubo para os campos. Isto sem esquecer que o mato deixado nos terrenos abandonados é altamente inflamável.

A limpeza não é apenas importante para o controlo dos incêndios. A biodiversidade de determinada região também tem muito a ganhar com o cultivo dos campos.

Exemplo disso são as espécies de aves que se alimentam no chão, das sementes agrícolas. Anos de agricultura levaram várias espécies a adaptar--se à actividade. Sem limpeza, as plantas crescem livremente e impedem as aves de se alimentarem e se manterem nos mesmos locais.

"As zonas de terreno agrícola são abrigo para espécies raras, como as abetardas da zona de Castro Verde, que não existiriam em Portugal se não fosse pelas grandes extensões de cereais cultivados", explica Carola Meierrose.

Uma ameaça que é preciso combater a todo o custo. A bióloga explica porquê: "Já só temos 24% de Terra emersa para agricultura e pastoreio, e agora querem arrasar as zonas de vegetação existente no mundo". O que ainda trava a destruição das áreas aráveis, defende a alemã, "é a falta de meios para o fazer"."


Fonte: DN Ciência

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