terça-feira, 25 de janeiro de 2011

...por isso quero falar contigo.

(…) – Perguntar o quê?... – diz em voz baixa, com uma ênfase depreciativa, como se fizesse troça de si mesmo. – O que é que se pode perguntar das pessoas com palavras? O que vale a resposta que uma pessoa dá com palavras e não com a realidade da vida?... Vale pouco – diz com determinação. – São poucas as pessoas cujas palavras correspondem por completo à realidade das suas vidas. Talvez seja esse o fenómeno mais raro na vida. Na altura, ainda não o sabia.

Agora não me refiro aos mentirosos, aos safados. Só penso que conhecer a verdade, adquirir experiências, de nada serve, porque ninguém consegue mudar o seu carácter. Talvez não se possa fazer mais nada na vida que adaptar à realidade com inteligência e cautela essa outra realidade inalterável, o carácter pessoal. É a única coisa que podemos fazer. E mesmo assim, não seríamos mais sábios, nem mais protegidos… Quero falar contigo, e ainda não sei se tudo aquilo que eu possa perguntar e tudo aquilo que tu possas responder não alterará os factos. Mas é possível a gente conhecer os factos, aproximar-se da realidade com a ajuda de palavras, perguntas e respostas: por isso quero falar contigo. (…)


Sándor Márai, As velas ardem até ao fim

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